A lei 9.504/97, que determina os procedimentos para as eleições,
também conhecida como Lei Eleitoral, costuma gerar polêmicas e dúvidas
entre quem pretende ingressar no funcionalismo público. O motivo é o
inciso V do artigo 73, que diz o seguinte: “Fica proibido nomear,
contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa,
suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou
impedir o exercício funcional e ainda, ex ofício, remover, transferir ou
exonerar servidor público, na circunstância do pleito, nos três meses
que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade do pleno
direito”.
Com isto, muitas pessoas acreditam que fica terminantemente proibida a
realização de concursos no período eleitoral, o que não é verdade. A
lei especifica que somente poderão ser nomeados, dentro do período
eleitoral, ou seja, a partir de três meses antes do primeiro turno e até
a posse dos eleitos, aprovados em concursos homologados até antes do
início deste prazo.
Acontece que a lei determina algumas ressalvas, que incluem nomeações
em cargos comissionados, em cargos do Judiciário, Ministério Público,
tribunais, conselhos de contas e órgãos da presidência da República;
nomeação de aprovados em concursos homologados até o início daquele
prazo; e nomeação ou contratação necessária à instalação ou
funcionamento de serviços públicos essenciais.
Para sanar as dúvidas que ainda persistem sobre o tema, o JC&E
ouviu o diretor acadêmico do site Questões de Concursos, Fernando
Bentes; o professor do curso Ênfase, Julian Barros; e o advogado
especializado em direitos dos concurseiros, Sérgio Camargo. Os
especialistas explicam exatamente o que pode ou não ser feito em termos
de concursos públicos durante o período eleitoral.
De acordo com o diretor acadêmico do site Questões de Concursos,
Fernando Bentes, existem motivos bastante justificáveis para que o
governo adote estes procedimentos. “Este dispositivo se justifica em
dois princípios constitucionais: a moralidade na administração pública e
a igualdade, no campo das disputas políticas”. Segundo ele, o objetivo é
impedir que governantes usem a nomeação de aprovados como fins
eleitoreiros. “Governantes poderiam fazer concursos e esperar às
vésperas das eleições para nomear os aprovados que, em contrapartida,
votariam novamente naquele candidato”, diz. “Isso é imoral e deve ser
coibido por lei. Qualquer uso eleitoreiro dos concursos é um desvio
imoral de sua finalidade”.
Fernando Bentes ainda afirma que, do ponto de vista da igualdade, o
dispositivo coloca em um mesmo patamar os candidatos que já ocupam
cargos públicos e os demais. “Se não houvesse essa lei, os governantes e
seus afilhados políticos teriam avantagem de conquistar votos por meio
de nomeações, em posição desigual aos candidatos de oposição. Este uso
da máquina estatal em benefício próprio poderia gerar uma eternização do
mesmo grupo no poder”, diz.
O professor do curso Ênfase, Julian Barros, observa que, além disto,
esta prática acabaria desvirtuando e influenciando a opção do eleitor,
impedindo de se concretizar uma das principais características da
democracia: a necessidade de alternância no poder.
Fernando Bentes enfatiza que, mesmo assim, é possível realizar
concursos durante todo o período de eleições, incluindo publicação de
editais, recebimento de inscrições e aplicação de provas. “A homologação
é uma das fases finais do concurso. Se a homologação ocorrer antes do
prazo de três meses das eleições, as nomeações podem ser feitas a
qualquer tempo, inclusive durante as eleições. Se a homologação ocorrer
após este prazo, as nomeações terão que acontecer posteriormente à posse
dos políticos escolhidos nas eleições, no início do ano posterior”,
explica. “A lei, na minha opinião, mostrou um silêncio eloquente, ou
seja, não proibiu a realização de concursos públicos como uma
demonstração de sensibilidade à necessidade de a administração pública
continuar trabalhando. A administração pública não pode parar porque
eleições estão ocorrendo”.
Para Fernando Bentes, é totalmente errado o mito popular que diz que
não podem ser realizados concursos durante o período eleitoral. “Os
concursos podem acontecer, acontecem e continuarão acontecendo em anos
eleitorais”, diz. A vedação legal, segundo ele, não se relaciona ao
trâmite do concurso em si, masa seu resultado. “Se for ano de eleição, o
candidato terá de esperar para ser aprovado, se a homologação ocorrer
no período eleitoral”.
O professor Julian Barros reitera esta opinião. “Este mito popular é
totalmente equivocado. É uma visão retorcida da realidade, mas que
parece ter ficado no inconsciente coletivo”, explica.
Já o advogado especializado em direitos dos concurseiros, Sérgio
Camargo, ratifica que “desde que o edital seja publicado em Diário
Oficial, o certame poderá ocorrer livremente, ressalvando nesse caso
nomeações e posse”.
Lei de Responsabilidade Fiscal – A Lei Eleitoral, de
certa forma, possui objetivos muito próximos da Lei de Responsabilidade
Fiscal, uma vez que ambas têm como objetivo punir o governante que usa o
cargo político em benefício eleitoral. “A Lei Eleitoral pune o
governante que não se pauta na moralidade para equipar a burocracia
estatal com recursos humanos, usando os concursos com fins eleitoreiros.
Da mesma forma, a Lei de Responsabilidade Fiscal impõe deveres de
regularidade, rigor e limitação ao proibir que o gestor aumente a
despesa pública sem apontar a origem dos recursos que financiarão novos
gastos”, diz Fernando Bentes. “Assim como a Lei Eleitoral, a Lei de
Responsabilidade Fiscal tem especial destaque em concursos, pois impede
que o gasto público aumente apenas para realizar concursos, sem que
existam fontes para estas despesas. Caso contrário, os governantes ainda
fariam concursos para garantir votos, mesmo aumentando a dívida pública
e inviabilizando a manutenção dos serviços e até mesmo a nomeação dos
aprovados”, afirma Fernando Bentes.
Julian Barros ressalta que a Lei de Responsabilidade Fiscal não deve
preocupar os candidatos, “pois é plenamente possível admitir servidores
sem necessidade de aumentar as despesas com folha de pagamento”.
Exceções – A Lei Eleitoral prevê a possibilidade de
nomeação ou contratação necessária à instalação ou funcionamento de
serviços públicos essenciais, mesmo durante o período eleitoral, o que
permite uma certa flexibilidade, em casos excepcionais. Fernando Bentes
ressalta que existe distinção entre a questão jurídica e a questão
política. “O aprovado em concurso dentro do número de vagas tem direito
subjetivo à nomeação, independente da vontade do administrador. Além
disso, existem casos de extrema necessidade de quadros técnicos de que a
administração necessita para planejar e fiscalizar suas políticas
públicas. O que não se pode permitir é a nomeação ilegal, nos moldes
descritos pela Lei Geral das Eleições. Mas não pode ser permitido que os
governantes se utilizem da emergência e da extrema necessidade para
perpetrar o desrespeito à lei, por fins eleitoreiros. Desta forma,
considero necessário que não sejam permitidas brechas na lei”, diz.
Já o advogado Sérgio Camargo considera qualquer tipo de contratação
nestas condições como ilegítima. “Este procedimento é ilegal,
ressalvados os casos de concursos que não entram no que determina a lei,
como do Poder Judiciário e Ministério Público”, comenta.
O professor Julian Barros considera legítima a existência destas
exceções, desde que efetivamente comprovado que sejam para garantir a
continuidade dos serviços públicos e não prejudique a população.
Para finalizar, Fernando Bentes reforça que não há motivos para que
os candidatos se preocupem com a Lei Eleitoral. “Concursos podem
acontecer normalmente durante as eleições. Portanto, nada de medo,
receio ou reticências em participar. Quem pretende concorrer em ano
eleitoral pode ter a certeza de que vários editais serão publicados,
provas acontecerão e se os candidatos não estudarem e participarem dos
concursos, perderão tempo e oportunidades preciosas para a aprovação”.
Sérgio Camargo também tranquiliza os interessados. “Não há o que
temer. O que de fato ocorre é uma diminuição nos certames públicos, pois
o Judiciário é o gestor da eleição e os pleitos eleitorais muitas vezes
envolvem o Executivo e o Legislativo”,explica.
Nas urnas – Os eleitores escolherão presidente da
República, governadores, deputados e senadores. O primeiro turno está
marcado para 5 de outubro e o segundo para o dia 26 de outubro.
Fonte: Jornal dos Concursos